Dentro da perspectiva científica, o tempo é uma grandeza relativa, tendo sua dimensão pautada na importância dos acontecimentos que abriga e nas circunstâncias em que estes ocorrem.No dia 17,sexta feira última, terminava um seqüestro em Santo André, interior de São Paulo, com a consequente morte de uma das reféns depois de centenas de horas sob a mira de uma arma e ,é necessário dizer, debaixo de inúmeros holofotes televisivos.Mais do que mensurar o tempo do ocorrido,número amplamente divulgado pelos veículos de comunicação, não convém salientar o período em que tal fato ocorreu mas as particularidades deste no que diz respeito ao noticiário exibido.
Após o desfecho do caso,cumpre questionar não somente sobre o papel do Estado, mas da estrutura midiática que cercou o evento, noticiando-o à exaustão, como se da divulgação dos incidentes dependesse o curso correto dos acontecimentos. Em contrário, a ampla cobertura da mídia, antes de facilitar a resolução, dificultou,segundo a própria, a ação da polícia, divulgando estratégias de ação e alçando o seqüestrador à figura pública, com direito à voz e a postar-se como agente midiático, paradoxalmente , noticiando sua própria façanha em programas de auditório e congêneres.
Neste viés, cabe-nos perguntar: Que tipo de serviço prestou a mídia à sociedade? De que forma poderiam os veículos de comunicação, se é que deveriam, postar-se em situações como esta? Como coadjuvantes no processo de preservação da vida e em auxílio do Estado, ou como foi o caso,como figuras centrais,interagindo com o seqüestrador e contribuindo com a piora do estado de ânimo deste, pela ampla, segundo a própria grande imprensa, divulgação das implicações legais de seu ato e do que o esperaria assim que libertasse as reféns?
Neste caso a vida imitou a arte,como no filme “O quarto poder”, em que o jornalista Max Bracket interpretado por Dustin Hoffman, acompanha um seqüestro de crianças dentro de um museu por um segurança, Sam Baily (John Travolta),que apenas queria o seu emprego de volta.De desempregado, Sam torna-se possível estrela de programa e tem sua vida devassada pela avidez da mídia em tornar sua ação um espetáculo, acabando por manipular informações de modo a direcionar a opinião pública primeiro a favor,depois contra ele.
Na vida real, o poder midiático no caso de Santo André, sob o pretexto de noticiar o fato, criando uma estrutura de apoio ao seqüestrador e ao mesmo tempo repassando informações acabou por contribuir com o insucesso da ação o que demonstra a ausência de propósito social na divulgação do evento,mas a mera intenção de criar e manter o show garantindo a audiência, sem nenhum pudor ou objetivo além deste.Segundo o escritor Guy Debord,em sua obra A sociedade do espetáculo, “O espetáculo não quer chegar à outra coisa senão a si próprio.”
Viva os jovens que pensam
Há 8 anos
2 comentários:
Legal a confluencia de pensamentos nesse determinado caso. Peguei-me analisando para minha família sobre esse espetaculoso sequestro e verifiquei que não é preciso mais ser de faculdade e fazer comunicação social para entender o espetaculo que aquilo se tornou. Pessoas nas ruas já entendem(finalmente) que aquilo realmente é espetáculo e que quanto mais saguinolento, melhor será.
Debord é sempre muito bem lembrado nessas horas de freak show=show de horror.
Com certeza!!Não é preciso ser comunicador para se ter senso crítico,apenas uma boa dose de questionamento em relação ao mundo.Não somos donos da verdade de modo algum,até porque ela não existe,sendo apenas uma interpretação da realidade..Aliás,cuidar para que cada vez mais existam pessoas capazes de compreender além da aparência e pensar sobre o universo que os cerca deveria ser a primeira e essencial preocupação de comunicadores, não??rsrs.
beijos
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